E se você pudesse capturar um instante? Aquele momento exato em que um olhar muda tudo, em que uma palavra não dita pesa mais que mil confissões, em que o silêncio entre duas pessoas contém universos inteiros de desejo e desilusão?

Este livro nasceu de uma provocação irrecusável: traduzir o intraduzível. Como encapsular em versos a voltagem de uma paixão que consome, a melancolia de um amor que se esvai, o abismo entre o que sentimos e o que conseguimos dizer? Aceitei o desafio sabendo que falharia — e que nessa falha encontraria a poesia.

O que você tem em mãos são diálogos impossíveis. Conversas que acontecem no limiar entre o real e o imaginado, onde duas vozes se encontram, se desencontram, se ferem e se curam através de palavras cuidadosamente escolhidas — ou perigosamente espontâneas. Cada poema é uma equação emocional, um quebra-cabeça onde forma e conteúdo conspiram para revelar verdades que normalmente escondemos até de nós mesmos.

Às vezes, as palavras surgem em profusão para construir cenários elaborados, mas o cenário permanece inerte, sem pulso. Em outros momentos, o silêncio diz mais do que qualquer verso poderia dizer, e as palavras se tornam quase dispensáveis diante da intensidade do que não é pronunciado. Escrever estes diálogos foi um exercício quase matemático, onde cada rima, cada pausa, cada escolha formal era ditada pelo instante preciso da criação — como se o poema já existisse em algum lugar e eu apenas precisava descobrir sua forma exata.

Há algo perturbadoramente íntimo no diálogo poético: ele permite que ambos os lados falem sem interrupção, sem a interferência do olhar alheio. Ao ocupar os dois lugares da conversa, o escritor se torna simultaneamente confessor e confessante, amante e amado, algoz e vítima. Mas o verdadeiro protagonista é você, leitor. Cabe a você imaginar os olhares não descritos, preencher os silêncios que habitam entre um verso e outro, reconhecer-se — ou não — nessas vozes que dialogam sobre amor, desencanto, saudade e recomeço.

Porque todo diálogo aqui registrado tem uma origem: uma história vivida, testemunhada ou simplesmente pressentida. São ecos de conversas que aconteceram em algum lugar, em algum tempo, entre pessoas reais ou imaginárias. Somente depois que as emoções se cristalizam no papel é que podemos ler o que habita nas entrelinhas, analisar com a razão aquilo que nasceu do sentimento puro, e compreender os motivos ocultos que deram vida a cada verso.

Escrever é sempre um ato de arqueologia interior. Cada palavra escavada revela camadas de quem somos, de quem fomos, de quem tememos ou desejamos ser. Estes diálogos são fragmentos dessa escavação: um inventário das nossas contradições, uma revisão honesta das emoções que nos habitam e por vezes nos assombram. Histórias vividas, ouvidas, sonhadas ou pressentidas, transformadas em versos que talvez digam mais sobre você do que sobre mim.

Minha gratidão aos amigos que se dispuseram a ler as primeiras versões destes diálogos, oferecendo comentários generosos e críticas necessárias. Suas vozes ajudaram a lapidar essas páginas, tornando-as mais verdadeiras.

Que este livro seja espelhos, janelas ou portas — o que você precisar que seja.

Santa Maria, 24 de outubro de 2025.
Marcos Cordeiro d’Ornellas